quinta-feira, 20 de novembro de 2014

XIQUEXIQUE: “ZÉ TEMPERO” UM VENCEDOR

Minha queria e saudosa escola Cezar Zama, o PRÉDIO 
20/11/2014
BZ PRESS 


José Batista dos Santos, é o nome de batismo. O apelido de Zé Tempero decorre do fato de que ele vendia temperos frescos (coentro, cebolinha, hortelã, etc...), que ele e sua mãe cultivavam no quintal de sua casa, sobre um jirau (prá quem não sabe o que é isso, trata-se de um estrado de madeira, com uma camada de terra adubada com esterco de animal, e era usado para proteger as plantas da ação de porcos e galinhas). 
Nos idos dos anos 50, Zé morava em uma daquelas casinhas de taipa, que existiam ali no final da atual Rua Rosa Baraúna, mais ou menos onde hoje está o Contorno. 
Dali em diante o que existia era o campo de aviação, ladeado por “florestas” de malvas, juremas e faveleiras, que lhe servia também de sanitário, e como papel higiênico, as folhas da malva. 
Pois bem, o Zé vendia esses temperos, para defender uns poucos e necessários trocados, ajudando a sobrevivência sua e de sua mãe. 
Todos os dias, no início da manhã, bem cedinho, antes de ir para a escola, lá vinha aquela figurinha mirrada, equilibrando sobre o fino pescoço uma enorme cabeça, batendo de porta em porta, oferecendo sua mercadoria, zelosamente transportada em uma pequena bacia esmaltada e imaculadamente branca, com um pouco de água no fundo, para manter o frescor dos temperos. 
Naquele tempo não existia a violência de hoje, e as portas das casas viviam abertas, o que facilitava a comercialização do Zé, que em cada porta berrava: TEMPEROS! 
Finda a primeira tarefa do dia, assegurado uns trocados entregues à mãe, o Zé vestia a farda, uma calça curta azul-marinho e uma camisa branca, pegava o tinteiro, a caneta (tipo pena) e o caderno e ia para o Prédio, como se costumava chamar as ESCOLAS REUNIDAS CEZAR ZAMA. 
O Zé foi meu colega, na classe da professora Honezinda Teixeira, grande mestra do passado desta cidade. 
Uma ou duas vezes por mês, havia a sabatina. A mestra dividia a sala em dois grupos, que ficavam em pé em cada lado da sala. Por indicação da mestra, cabia a um dos integrantes de um dos grupos, fazer perguntas a outro integrante do outro grupo. 
Se a resposta fosse errada, o “infrator” tomava um “bolo de palmatória”, aplicado por quem perguntou, e saía da sabatina, ia se sentar, dizia-se então que “caiu”. 
Se resposta fosse certa, o direito de perguntar passava para aquele grupo, e o aluno que foi inquirido, agora tinha o direito de escolher quem quer que fosse do outro grupo para perguntar, e assim por diante, até restar apenas dois “contendores”, um de cada lado. 
Normalmente ficávamos o Zé e eu. O crioulo era sabido, esperto e não era fácil lhe dar um “bolo” ou “derrubá-lo”. 
A diferença entre eu o Zé, era que minha mãe me preparava muito bem, nem sempre com a minha boa vontade, quando entravam em cena uns cascudos, puxões de orelhas e outros “argumentos” do arsenal materno. 
O Zé, sabe-se lá como se preparava, se ao menos tinha tido tempo de estudar. 
Exaurido o estoque de perguntas, a mestra dava por encerrado a contenda, a sabatina, e nós dois, os últimos em pé, recebíamos uma salva de palmas de toda a classe. EMPATE! 
Findo o curso primário, em 1955, quem tinha recursos, ia estudar em outra cidade, pois naquela época, Xiquexique não tinha sequer um ginásio. 
O Zé ficou por aqui até que em 1959, foi inaugurado o Ginásio Senhor do Bonfim, que naquela época, embora municipal, era pago. 
O Zé fez o exame de admissão e passou em primeiro lugar. 
Dr. Hélcio Bessa, vendo a situação do Zé, instituiu um prêmio, para todo aluno aprovado em primeiro lugar, poderia cursar o ano seguinte sem nada pagar. 
O Zé fez todos os 4 anos de ginásio sem pagar um tostão, e ainda recebia algum, por trabalhar na Secretaria do GSB. 
Terminou o ginásio e o Zé ficou sem ter o que fazer. Trabalhava de servente de pedreiro e como sempre foi benquisto, algumas pessoas lhe ajudavam com o que podia. Uma delas, minha prima Marilúzia, que lhe reservava sempre um prato de refeição à noite. 
Um dia o Zé disse para Marilúzia, que ia haver um concurso para o Banco do Nordeste, na cidade de Irecê, que ele tinha certeza que seria aprovado, mas não tinha o dinheiro para o transporte. 
Marilúzia prontamente lhe deu o dinheiro, o Zé foi a Irecê, fez o concurso e foi aprovado. 
Fez uma carreira no Banco do Nordeste, aproveitou o tempo e as oportunidades para fazer um curso de Direito, se diplomou e hoje, o Zé, que está aposentado do banco, exerce a advocacia e se estabeleceu em Montes Claros, cidade natal de sua esposa, onde se radicou e cria sua família. 
Com estas modestas linhas, quero mostrar aos jovens, especialmente àqueles mais pobres e/ou negros, que com força de vontade e dedicação, se consegue romper os grilhões de uma situação desfavorável. 
Quero também, na pessoa do Zé Tempero, homenagear todos os negros. 
Como já disse um poeta: “quem sabe faz a hora, não espera acontecer”. O Zé não esperou, fez a sua hora e aconteceu. 
Zé Tempero, meu amigo, meu irmão, meu ídolo.

3 comentários:

  1. Bela homenagem!!!! meu pai sempre me falava de Zé do Tempero.

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  2. QUE LINDA HISTORIA. ISTO É UMA PROVA QUE NÃO PRECISAMOS DE COTAS QUE SÓ SERVEM PRA ETERNIZAR O PT NO PODER.

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  3. Justíssima a homenagem, este senhor sempre foi determinado e vencedor, não deixou fugir nenhuma oportunidade, merecedor te todos os elogios e como atenuante a vaidade não faz parte de sua cartilha.
    A propósito, me chama a atenção que, até para comentar fatos alvissareiros, existem anônimos, isso é lamentável, não contribui com a verdade democrática. Osvaldo Barbosa

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